sábado, 20 de junho de 2020

Criei um blog, enfim.


A internet tem me feito um mal tremendo...

Quase todas as manhãs tenho um hábito que considero péssimo: antes de olhar pelas janelas do quarto, ainda deitado, abro as janelas do Facebook e alimento meus olhos com porções generosas de brilho e cor com a desculpa quase desonesta de que preciso despertar logo para tratar dos afazeres. Olhar a tela luminosa do celular, ou receber seus estímulos sonoros, de fato ajuda a acordar. Instantes depois percebo que a primeira coisa que vi no dia foi uma propaganda de que não preciso, ou uma piada de mal gosto acompanhada de um desenho mal feito, ou ainda, quando o meu dia realmente começa mal, é porque antes mesmo de levantar da cama eu li alguma nova catástrofe do governo. Às vezes é difícil não se arrepender disso quando você percebe que, com um pouquinho mais de esforço, poderia ter ido até a janela e afastado as cortinas: a luz que vem do céu e o murmurar da cidade também ajudam a despertar com a mesma eficácia e certamente com menos desgosto.


Eu não reclamo sempre do Facebook, ou do Instagram ou qualquer uma das principais mídias sociais que nós usamos hoje. Preciso delas para entrar em contato com quem não poderia de outra forma, como amigos que moram em outras cidades. Levando-se em conta as atuais circunstâncias preciso delas até mesmo para conversar com pessoas que moram muito perto.



Escrevo isso no dia 19 de junho de 2020 e para boa parte do mundo - principalmente brasileiros - a pandemia de coronavirus ainda está longe de ser história. Se você é um arqueólogo digital saiba que este foi um período muito difícil para as pessoas, independentemente de quantos terabites de lives musicias você conseguiu recuperar dos destroços da humanidade...


Brincadeiras à parte estamos, ainda, no meio de uma pandemia e de uma crise sem precedentes, você sabe bem disso. As medidas de distanciamento e isolamento social nos obrigam a ficar em casa por longo tempo: há pessoas que saem de casa apenas uma vez por semana desde março, outras nem isso. Eu sou uma destas pessoas que está levando a sério as medidas de prevenção - o máximo que meu país permite que eu as leve - e talvez esse desconforto que venho tendo com as redes sociais tenha se agravado a partir de um contato ainda maior que tive com elas desde que esta situação começou.


Como nativo digital – me sinto até mais jovem dizendo isso – é impossível não reconhecer o papel que estas mídias tiveram sobre mim; não fossem elas não teria tido acesso a informações valiosas sobre assuntos que me são muito caros hoje. No entanto, isso não me permite negar que hoje hábitos nocivos se constroem sobre estas mídias, hábitos estes que vão desde nosso bem-estar pessoal até a relação que mantemos com nossos semelhantes. Para não soar leviano, e para cumprir com o que pretendo através deste blog, cito: usamos nossos smartphones até os últimos segundos da noite, pouco antes de cairmos no sono – isso quando não desmaiamos – assim estendendo em muito nosso período de vigília; também depositamos um alto nível de confiança nas mídias, desproporcional às nossas vontade e capacidade de investigação, o que nos leva, eventualmente, a agir de maneira enganada e preconceituosa com diversos assuntos e pessoas.


Se falo no plural é porque percebo isso na vida de pessoas que são próximas, mas sinto isso muito profundamente em minha própria vida. Há algum tempo atrás decidi mudar hábitos alimentares - o que me levou a mudar minha ética - e hoje percebo que assim como certos alimentos podem me fazer mal, consumir certas informações podem me fazer um mal tremendo; aliás, mesmo quando a informação parece ser inofensiva, ou até mesmo benéfica, se a consumo no ritmo e na proporção errada, algum dano certamente emerge. Nutrição e informação parecem mesmo ter muito em comum.


Dia após dia vejo que fico muito tempo passando os olhos por posts e mais posts, sem saber muito bem o porquê; que me irritei demais com pessoas que desconheço, macerando respostas fulminantes no veneno denso da vingança, só pra depois perceber que não vale a pena e então desistir; fiquei coletando links, e-books, e artigos na bolsa infindável da ganância, da vontade de conquistar o mundo com uma inteligência que me falta. Todas estas atitudes, e ainda outras, me fazem muito mal, pois me roubam a tranquilidade e apagam minha clareza. 

Por isso que decidi fazer um blog


Fazer um blog pra fugir disso tudo… 


Olhando para meus motivos talvez fazer um blog, ou aderir a qualquer outra plataforma digital, pareça bastante incoerente. Se a pessoa sofre com essa joia caótica do século XXI o melhor seria desligar-se completamente, não?

Não acredito que isso seja praticamente possível para mim, na verdade não é nem mesmo desejável. Cresci com a internet e seus frutos e me habituei a eles e há muitas coisas a serem aproveitadas e descobertas. Creio que o problema resida de fato no ritmo e no hábito.


Se ao invés de procurar o máximo de diversão em várias fontes eu procurasse uma fonte segura de diversão, talvez eu não terminasse meu dia com a sensação de tempo perdido.

Se ao invés de me preocupar em absorver grandes quantidades de informação eu procurasse selecionar cuidadosamente a informação que absorvo, talvez terminasse o dia sem me sentir tão confuso.

Se ao invés de me preocupar em entender de diversos assuntos, ler diversos livros e fazer diversas coisas, eu me preocupasse em dar um passo de cada vez para entender e conhecer uma coisa de cada vez, talvez eu não terminasse o dia com a sensação de não saber coisa alguma.


Talvez tudo seja um grande problema de hábito e ritmo. Não há razão em se desfazer de uma ferramenta só porque a uso de maneira errada; se eu aprender a manusear, ela pode ser proveitosa.

Como não estou sozinho no mundo penso que muitas pessoas podem estar vivendo da mesma maneira, talvez de modo ainda mais frenético, pois sei que não tenho a vida mais agitada. Logo, penso que esta atitude de “diminuir o ritmo” e agir com mais ponderação com as informações contribui muito para o bem-estar de todos. Escrever um blog pode fazer parte disso.

Quando os blogs surgiram eu era uma criança e lembro muito bem que a proposta, no começo, era de que as pessoas tivessem uma espécie de diário aberto para o mundo. Me fascinava a ideia de pessoas de todas as partes compartilhando suas experiências e seus pensamentos. De fato as pessoas fazem isso mas algo estranho aconteceu no percurso.

Blogs mudaram e começaram a ficar especializados, servindo a promoção de estilos de vida empacotados. Logo depois deles vieram as redes sociais que, apesar de terem essencialmente a mesma proposta, acabaram nos levando para uma atitude de provar a tudo e a todos que nossa rotina é uma sucessão de coisas empolgantes – ou ao menos deveria ser assim. Precisamos mostrar que estamos felizes o tempo todo, ou que somos bonitos o tempo todo, ou que sabemos muito sobre as coisas que acontecem o tempo todo. No fim das contas não compartilharmos o que de fato somos, mas inventamos algo que não somos. O curioso é que muitas vezes fazemos isso só para nós mesmos: estamos tão preocupados neste empreendimento de nos adequarmos que não olhamos de verdade para os outros.

Seria muito bom ver as pessoas escrevendo blogs novamente, naquela antiga proposta de trazer uma história de cada vez, sem agendas eficazes e propostas lucrativas. Há até mesmo um movimento, o slow blogging, que busca resgatar isso. Não preciso nem dizer que sou adepto.


Ok… eu sempre gostei disso…


Quem me conhece sabe que sempre gostei de escrever e algumas pessoas sabem que já fiz alguns blogs a respeito de muitas coisas – blogs que depois de um tempo eu sempre apagava afinal “ninguém vai ler mesmo”. Isso porque tinha essa mente de conquista, de ter “um blog de sucesso” mesmo que negasse isso veementemente. Afinal para que ter um blog se não para ficar famoso e rico, não é?

Se eu quisesse ficar famoso e rico eu estaria fazendo outras coisas agora…


Criei um blog porque gosto de escrever. Gosto de dissertar sobre coisas no teclado da mesma maneira que gosto de conversar longamente com um amigo sobre um assunto; da mesma maneira gosto de resenhar um livro ou um álbum musical; também gosto de escrever ficções e recentemente retomei o gosto pela poesia. Sempre tive muitas reservas em fazer isso tudo (principalmente com estes últimos) mas cheguei em um ponto de minha vida em que percebi que se eu não viver plenamente eu muito provavelmente não vou ser uma pessoa feliz.


Abrir mão destas reservas (e de muitas outras) talvez possa me ajudar a viver plenamente.


Se você chegou até aqui provavelmente é um amigo, um aluno ou um familiar meu. Isso quer dizer que você é muito importante para mim então digo: viva plenamente. Por aqui vamos conversar sobre viver plenamente, de diversas formas, e vai ser muito bom saber que você está lendo e me conhecendo de verdade.