sábado, 15 de junho de 2024

Uma porção de coisas boas

As duas últimas semanas desse fenômeno incrível que chamo de minha vida foram de fato muito, mas muito agradáveis. Na verdade parte do que tenho pra contar nem cabe no adjetivo agradável, é muito maior que isso, é mais algo que cabe em um outro adjetivo, que pego da comon tongue : parte do que aconteceu comigo nestas duas últimas semanas foi life-changing. Tem a ver com escrita, obviamente, mas também tem a ver com coisas práticas da vida e perspectivas sobre ela. A gente nunca de fato vê quando coisas assim surgem, sendo elas boas ou ruins, e sei que tudo tem começo e fim, por isso estou feliz de poder estar vivendo isso agora. Que minha felicidade em testemunhar esse existência se espalhe por todo o cosmos - sejá lá o que isso pode significar. 


O rito foi concluído

Mencionei no meu último post sobre um conto de auto ficção que estava elaborando e como sua produção foi (e ainda está sendo) um rito para mim. Não sei ao certo se devo tratar como um rito de iniciação ou um rito de auto redescoberta: embora a escrita seja uma arte que me acompanha desde a infância a sensação é que foi desta vez que decidida e definidamente entrei no mundo da escrita de fato, mas ao mesmo tempo também está presente a ideia de que na verdade eu apenas retornei para algo que sempre esteve ali, algo que sempre fez parte de mim e que estava na verdade esperando eu voltar com uma caneca quente de café e um lugar aconchegante para escrever tudo que queria. São sensações ligeiramente diferentes, mas no fundo creio que representam a mesma coisa. 

O mais importante que tenho a contar agora é que terminei de escrever este conto. Desde que a semente da escrita plantou-se em minha mente explorei esta arte de muitas maneiras, mas nunca consegui de fato terminar algo: havia muita incerteza, fragilidade e dor envolvida. Hoje eu tenho um conto terminado, algo tão simples mas que teve um impacto tremendo.

Eram cerca de 1:30 da manhã de sábado quando escrevi as últimas palavras do conto e quando percebi que de fato havia acabado de escrever uma história algo aconteceu. Como adjetivar este algo? Algo fascinante, curioso, intenso, estranho? Cabe em todos estes e em nenhum...simplesmente foi algo, algo que mudou alguma coisa em mim. Quando me dei conta de que havia enfim acabado de escrever um conto levantei da cadeira e caminhei lentamente até a cozinha para preparar um chá embora meus pés estivessem firmes no chão e eu sentisse sua solidez, era como se eu caminhassem em nuvens. Tudo em minha volta era exatamente o que tinha de ser: paredes, sofá, mesa cafeteira, chaleira, televisor e janelas, mas ao mesmo tempo era como se fossem feitas de algo mais sutil, mais delgado: por um momento pensei que poderia atravessar minha mão por todas estas coisas, porque ela também parecia assim. 

Depois que esse pequeno êxtase passou fui até a janela para observar o céu noturno: completamente negro. Era uma noite muito nublada, logo nenhuma estrela podia ser vista, uma escuridão total a não ser pela luz dos prédios vizinhos. Pensei na imensidão do universo e como tudo aquilo que se passou é tão pequeno frente essa imensidão, mas isso me acolheu com uma sensação de que há tanta coisa para conhecer e que, de certa forma, eu estou trilhando o caminho certo. Bebi o chá lentamente, olhando pro céu sem estrelas, apreciando cada pequeno instante. 

Foi durante essa conversa silenciosa com a noite que senti que algo em mim havia mudado. Creio que tem muito a ver com a certeza que expressei sobre a escrita, de que vou praticar esta arte até o fim dos meus dias. Verbalizar isso com uma força convicta parece ter mudado alguns rumos, parece ter direcionado meus olhos para outras dimensões de minha vida que estavam ocultas. Foi um ato de vontade pura e que surtiu um efeito inesperado mas também bastante tangível...há algo interessante aqui. 


Uma nova carruagem


Eu e minha esposa conseguimos, depois de muito tempo, vender o velho corsa que nos acompanhou por mais de dez anos. Adorávamos esse carro mas há tempos já apresentava problemas e viajar com ele era sempre um tanto estressante: volta e meia algo dava defeito ou quebrava. Além disso não era um carro muito sortudo: bateram nele muitas vezes e em uma recente viagem que eu fiz uma pedrinha caiu de um caminhão e trincou o para-brisas; com o tempo este trincado aumentou de tamanho e viajar com ele era uma aposta que poderia nos custar muito caro. 

Com a venda deste carro conseguimos comprar o carro do meu sogro, um Uno 2015, muito bonito, aconchegante e confiável. Eu estava tão habituado com as dificuldades do corsinha que coisas básicas como vidros e travas elétricas que de fato funcionam, bom sistema de som e uma embreagem suave parecem a melhor coisa do mundo. Estou praticando a teoria das botas apertadas de Machado de Assis e garanto a vocês, funciona mesmo.

Nunca fui muito ligado no assunto carros e sei que isto - embora muita gente considere algo básico - ainda é um luxo pra maioria das pessoas, mas consigo olhar pra esse momento agora e perceber que nós nos esforçamos muito pra conquistar algo assim; este é o primeiro carro que compramos com nosso próprio dinheiro. Novamente, só posso ser grato e desejar que todos possam usufruir do mesmo que sinto agora. 


Aulas sobre leitura e um novo lugar para o blog


Também estou conseguido trabalhar assuntos que sempre quis trabalhar com meus alunos: tenho passado para eles alguns estudos sobre a arte da leitura de uma maneira que me parece muito proveitosa. Parte destes estudos baseia-se na obra Como ler um livro, que traz uma perspectiva bastante analítica da leitura, mas que é de fato muito eficaz: ao terminar de estudar o caminho que os autores traçam o leitor consegue ler com mais atenção e com maior poder de análise. Há tempos queria usar isto em aula, e até consegui fazer com um ou dois alunos em minhas aulas de inglês, mas enfim estou trabalhando este assunto de maneira mais organizada e com alunos que hão de se beneficiar deste estudo. 

Recentemente também decidi abrir uma conta no Neocities e estou me aventurando novamente no HTML. A ideia é montar um site estilo Web 1.0 para abrigar este blog e alguns outros projetos de escrita. Isso tem a ver com as minhas perspectivas a respeito da internet nos dias de hoje, mas também tem algo estético ai: escrever e ler coisas em sites de Web 1.0 tem um sabor especial. 


sábado, 1 de junho de 2024

Um rito

Não fiz as contas, mas creio que já estou na minha segunda semana consecutiva em que estou escrevendo todos os dias. Poucas coisas mais maravilhosas do que está já me aconteceram - a principal delas foi eu ter tido a sorte de ter me casado com a mulher da minha vida - e eu estou me sentindo como não me sentia há muito, muito tempo. Tanto tempo que na verdade não sei nem mesmo se alçgma vez já aconteceu e nem mesmo sei qual a melhor palavra pra isso. Talvez a palavra seja completo, mesmo que a arte da escrita seja, em essência, algo que opera sobre coisas incompletas. 

Talvez possa parecer estranho que algo tão pequeno pareça tão maravilhoso. Se ao menos estivesse comemorando a publicação de um livro, ou de uma história que o seja, talvez esse entusiasmo todo soasse mais compreensível, justificado. Não sei o que as pessoas pensam a respeito disso pra falar a verdade, não quero saber. Se a questão surge é por ser um resquício de um hábito muito nocivo e que já sinto o cheiro de longe. Estou definitivamente cansado de exercitar ideias de como as pessoas veem certas coisas, principalmente aquelas que só dizem a respeito a mim. Foi isso que prejudicou, em algum momento da minha infância ou adolescência, a arte da escrita, uma arte que sempre foi tão cara para mim. Em algum momento devo ter dado importância demais a algum comentário negativo, alguma piada ou ataque o que acabou mergulhando todas as minhas tentativas de escrita sob camadas e mais camadas de uma autodepreciação intensa escondida sob um véu de autocrítica. Foi difícil vencer isso tudo mas sinto que finalmente venci. 

Bem, eu já falei sobre isso aqui e não quero falar de novo. Quero comentar que estou no que parece ser a metade de um conto de autoficção com boas doses de realismo mágico e que sei que vou terminar. Perceba bem, velho blog: eu sei que vou terminar este conto. Perceba leitor do velho blog: eu escrevi estas palavras!  O prazer em fazê-lo é tamanho que vou até mesmo colocá-lo como citação aqui embaixo.


 "Eu sei que vou terminar de escrever este conto" J.O.S. Quevedo

 

Eu jamais escrevi isso, sequer disse isso a mim mesmo, com tanta certeza e tranquilidade. Na verdade estou tão certo disso que mesmo que os deuses da vida e da morte venham me fazer a visita derradeira daqui há a vinte segundos eu tenho certeza que vou terminar esse conto de alguma maneira. Não acredito em reencarnações, tampouco em paraíso ou inferno, e embora eu tenha suspeitas a respeito da existência de dimensões e universos paralelos (principalmente da maneira em que são apresentados nos episódios de Ricky & Morty) sinto que provavelmente as coisas não devem ser tão simples assim para que alguém ressurja em um mundo absolutamente diferente deste e termine um trabalho que aqui foi iniciado. Ainda assim eu SEI que vou terminar de escrever este conto. Como é bom sentir essa certeza. 

Esse conto é um gesto terapêutico para mim. Através dele estou acessando um sonho que carrego há muito tempo, ressignificando- o e lhe dando mais força. Também é uma espécie de rito onde o meu eu escritor está sendo rebatizado; ou talvez ele precisasse atravessar esse deserto de negação e dúvida por todos estes anos para que então começasse a existir de fato. Ambas as hipóteses são muito interessantes.

Muita força, amor e vida estão pulsando no processo de escrita e ele também está me ajudando a ler de maneira diferente: cada livro que eu leio é como um combustível, não só me abastecendo com ideias, imagens e símbolos, mas também com técnicas. Estou lendo alguns livros e eles estão me falando sobre a arte de cada autor, atitudes que gosto e não gosto, coisas que sei que posso fazer, coisas que ainda não posso e também coisas que sei que posso até fazer melhor se me dedicar adequadamente. Essa leitura se estende para uma leitura do mundo também, mas ela acontece de maneira um pouco mais criativa: uma placa, um olhar, uma bola de sorvete, uma caneca, o aroma da rua...qualquer coisa surge como um sinal para uma história que quer nascer e eu, como um explorador furtivo em dimensões oníricas capturo cada uma destas coisas e as guardo cuidadosamente em uma algibeira. Uma algibeira que guarda quartos e salões, todos devidamente equipados, e bem umedecidos para que essas ideias vigorem e cresçam como árvores gigantescas.

Ainda estou pensando se vou publicar ou não este conto assim que estiver pronto. Por ser uma autoficção é sem dúvida muito pessoal, mas não é isto que talvez impeça-o de ser publicado: ele parece ter sentido apenas como esse rito que mencionei, apenas como uma sinalização de que outras histórias estão vindo. Sim velho blog, pode ter certeza: centenas de histórias estão vindo. Isso porque há outra coisa que posso escrever com uma certeza tão brilhante quanto todos os sois possíveis condensados na ponta de uma agulha:


Eu vou escrever até o fim dos meus dias...até o fim dos meus dias. 


Eu estou no melhor lugar do mundo agora e estou me sentindo a vontade para estar. 

Que todos os seres possam sentir isso um dia.